sexta-feira, março 16, 2007

Crónica Taça UEFA - Toujours, Capitaine Simão!

Todos sabemos que o Paris SG está num péssimo momento da época mas, como vimos no encontro da 1ª mão, estaria tudo em aberto na discussão da eliminatória. O Benfica não fez um mau jogo em França, mas 10 minutos catastróficos custaram uma boa e decisiva vantagem. O problema da 2ª mão subsistia, então, na possibilidade dos franceses marcarem e obrigarem o Benfica a ter uma almofada de dois golos para prosseguir na Taça UEFA. O adversário era mais ou menos fraco, portanto, mas um golo forasteiro complicaria bastante as pretensões da equipa da casa. E com Pauleta à solta as coisas poderiam complicar-se ainda mais! No cômputo geral, a exibição acaba por ser tremida, com 10 minutos muito bons, mas é justo ser o Benfica a passar para os quartos-de-final… principalmente quando ainda atirou 2 bolas ao ferro.

O primeiro grande problema, na abordagem a este jogo, foi a incompreensível opção de Fernando Santos em Moretto. O busílis da questão nem está em relegar Moreira como 3ª opção para a baliza – nem é por aí que se devem basear as críticas –, mas sim em tomar esta decisão quando foi Moreira que substituiu Quim frente à União de Leiria. Qual o sentido de dar esse tipo de confiança a um guarda-redes, fazer sentir que se acredita nele caso o titular se lesione, e depois dar o lugar a outro? E ainda por cima dar a titularidade a um guarda-redes que ainda não conseguiu provou categoria indiscutível no Benfica, mal amado por 80% dos adeptos, e num jogo crucial! Não havia, já, problemas suficientes para lidar?

Tremedeira evitável

O Benfica não entrou bem no jogo, algo que surpreendeu, e viu o PSG acercar-se da baliza e causar algum frisson. Pauleta, logo aos 2 minutos, tem uma óptima oportunidade para adiantar a sua equipa no marcador mas remata à figura de Moretto, que sacode para canto. Daí até aos 5/7 minutos os franceses dominaram e aproveitaram algum desnorte do Benfica para manter a bola no meio-campo contrário. Foi com o golo de Simão, após assistência magistral de Nuno Gomes, que o “castelo de cartas” parisiense desabou por completo. O empate tranquilizou o Benfica de forma evidente, levando a um massacre à baliza do internacional francês Landreau. Katsouranis aproveitou novo passe magnífico do #21 e estoira na barra, na sequência do lance Karagounis acerta no poste. Miccoli e Nuno Gomes, na mesma jogada, também têm oportunidades para facturar mas sem sucesso.

Perante tantas oportunidades, nada mais natural que o surgimento do 2-0, mas a forma como tal aconteceu não tem nada de normal. Petit ganha no confronto directo, a bola sobra para Léo, que mete de novo em Petit… e o trinco do Benfica faz um divino chapéu que corta a respiração de todos aqueles que estão grudados na jogada. Foi “audível” o silêncio naquele segundo que a bola sobrevoa Landreau, e bate na malha de dentro da baliza. Foi incrível, foi sublime! A melhor forma do Benfica se adiantar no marcador era, mesmo, com um golo ao nível do melhor que a Europa já viu este ano! Todas as descrições são supérfluas, o melhor é mesmo (re)ver o lance em vídeo.

Com a eliminatória a seu favor seria expectável que o Benfica tentasse controlar e baixar o ritmo, mas o futebol tem destas coisas. Contra a corrente de jogo, Anderson deixa Pauleta fugir mais uma vez e este mostra todo o seu instinto de goleador, fazendo o golo e empatando a eliminatória. O cabeceamento é impecável mas Moretto não fica isento de culpas. Não é, propriamente, um “frango” mas há claras responsabilidades do guardião benfiquista. E, com este incrível falhanço do sector recuado, o Benfica tremeu e deixou de ser a equipa que se impôs esmagadoramente durante 20 minutos. Os assobios do público também não ajudaram, serviram sim para intranquilizar a equipa de forma ainda mais evidente!

Passaram mais de 40 minutos sem sombra de remates da equipa da casa, e o desespero do público era ainda maior quando não se via qualquer reacção do banco. Houve alguma sorte no facto do empate não ter aparecido e muita azelhice do adversário, em mais uma má 2ª parte por parte do Benfica. A lesão de Karagounis terá tido uma importante fatia de responsabilidade nessa situação. Mas quando já todos víamos o prolongamento ali tão perto, Léo é protagonista de uma jogada ao seu estilo e, depois de um sprint e de duas fintas, é ceifado dentro da área. O indiscutível penalty, a 4 minutos dos 90, garantiu o merecido apuramento. Simão resolveu, como sempre!

Melhor que Simão? Onde?

A nível individual destaco os dois melhores em campo, Simão e Petit, e os dois piores, Anderson e Moretto – falar de Nelson já é completamente recorrente. Petit voltou a calar aqueles que de futebol nada percebem, não só com um grande jogo mas também com um golo deste e do outro Mundo. Petit é a pura classe num trinco, o pulmão e a âncora deste Benfica. Recuperou inúmeras bolas, iniciou quase todos os ataques… exibição magistral!
Simão Sabrosa é, para mim, o melhor jogador português depois de Cristiano Ronaldo. A forma como não tremeu, num momento tão importante quanto o decisivo penalty, demonstra que já atingiu o patamar daqueles que são reconhecidos como os melhores jogadores da história do Benfica. Em dois jogos fez três golos, isso diz tudo acerca da sua importância!

Não há um único jogo onde o Moretto sai com a folha imaculada, da última vez que actuou pelo Benfica deu uma frangalhada estrondosa em Paços de Ferreira.
É um guarda-redes horrível – a forma como se faz aos cruzamentos é de bradar aos céus –, e para mim será o pior da história do Benfica… pelo menos daqueles que já tiveram vários jogos para provar o seu valor É mau, muito mau! Para além disso não tem uma personalidade de que gosto, muito espalhafatoso, bipolar e convencido. Completamente oposto ao low profile de Quim e mesmo de Moreira. Aos 29 anos tem de sair, rapidamente, não só do 11 como do Benfica. E só não saiu já por causa da forma como entrou. Parece-me óbvio! Não meter o Moreira, que é da casa e sempre mostrou qualidade até para ir aos AA, é uma canalhice nandinhesca ao nível de quando Koeman meteu Ricardo Rocha a defesa-esquerdo, deixando Léo quase dois meses no banco. É profundamente idiota, quase custava a eliminatória e vai custar a Liga se o treinador insistir.

A marcação individual de Anderson a Pauleta foi algo parecido com um dilúvio bíblico. Raramente se conseguiu antecipar e permitiu tanto espaço ao açoriano que este teve 4 oportunidades de golo completamente à vontade – um remate para Moretto, um golo, um falhanço de menos de meio metro e, já na segunda parte, um remate completamente à figura a sensivelmente 20 metros da baliza.
O #3 continua a não estar bem nos grandes jogos, o que é algo inexplicável tendo em conta o seu historial de enormes exibições na Champions League do ano passado.

Alemão, mas fraquinho

A partida foi muito complicada para a arbitragem, das mais complicados desta época na Luz, e Florian Meyer nunca conseguiu segurar o jogo e contribuir para o espectáculo. Incrivelmente mostrou cartões algo discutíveis mas esqueceu-se deles no bolso em situações muito mais gravosas. O amarelo logo no 1º minuto faz pouco sentido porque esse critério, de punir entradas duras e sem bola, nunca foi seguido em conformidade.
Nesse aspecto, o dos cartões diga-se, o Paris SG foi claramente beneficiado, em virtude da dureza excessiva da sua defesa… por outro lado, o Benfica viu-se beneficiado nalgumas faltas a meio-campo que não foram assinaladas.

Pecou ainda – e aí acho que é um erro bastante grave, que lhe poderá dar problemas –, na forma como foi pouco expedito na gestão da assistência médica aos jogadores caídos. A massa adepta do Benfica está marcada, para a vida, por este tipo de lances, mas não é aceitável que um árbitro credenciado, e da escola alemã, permita que os atletas estejam tanto tempo prostrados em campo. Uma dessas situações deu origem a um sururu, que não conseguiu resolver, quando Derlei estava no chão e foi provocado e quase agredido por dois jogadores franceses. Se o jogo tivesse sido interrompido nada disto teria acontecido!

Resta analisar, claro, os dois lances disputados na área – sinceramente não me recordo do outro lance em que fala Paul Le Guen. E aqui muita gente gosta de discutir arbitragens e insinuar benefícios mas a esmagadora maioria delas não sabe as regras de futebol. Assim, no lance de disputa de bola entre Nelson e Luyndula, não há nada mais que uma carga de ombro do defesa do Benfica. Ora, mesmo que exista uma queda do avançado parisiense, o referido gesto técnico não é considerado faltoso em qualquer parte do campo… portanto, não há lugar a qualquer penalty.
No lance com Léo, o abalroamento é tão óbvio que é impossível um penalty ser tão claro! Só má fé, ignorância ou alguém que não viu o lance correctamente, poderá dizer que não há falta. Qualquer árbitro do Mundo – honesto, obviamente –, teria indicado a marca dos 11 metros. Claro que, para aqueles que já faziam uma festa com a possível eliminação do Benfica, custa muito… é a viding!

O Inferno na Luz…

Tão orgulhosos que nós somos do nosso Inferno da Luz, mas que se torna por vezes num Inferno na Luz. E foi precisamente isso que aconteceu neste jogo!
Uma coisa é achar que o Fernando Santos e o Moretto são do mais incompetente que já passou por este clube, como eu acho, outra coisa é assobiá-los e fazer tristes espectáculos prejudicando a tranquilidade e aspirações do Benfica. É incrível ver um atleta no chão a ser assistido pela equipa médica, e ver o público a gritar o nome do seu concorrente directo. Tenha o envolvido Moretto na parte de trás da camisola, ou outro nome qualquer, é algo que nunca tinha visto em 26 anos de benfiquismo e que nem sequer consigo qualificar. Para ser assim mais vale ter só 50 mil e esses serem apoiantes a sério. Assobiar os nossos é algo que nunca vou conseguir entender!

No que diz respeito ao sorteio, tornei público que gostava que fosse o Tottenham o adversário do Benfica – sou um enorme fã de Dimitar Berbatov –, mas é com o Espanyol de Barcelona que se irá decidir a passagem às Meias-Finais da Taça UEFA. Equipa difícil mas ao alcance de um Benfica ambicioso e tranquilo. Que não sejam as lesões, as opções de Fernando Santos, ou as quebras físicas, a diminuir as possibilidades de sucesso!
Em dois anos consecutivos o Benfica chega a Março e ainda disputa uma prova europeia, confesso que já não me lembrava de tamanho feito. O Benfica está de volta, que seja para ficar que nós agradecemos!

NDR: Guardo, obviamente, um espaço para escrever sobre Pedro Pauleta. Não partilho a opinião daqueles que relativizam a carreira deste açoriano, e que minimizam os seus feitos quase como que virando as coisas a um dos melhores avançados portugueses de todos os tempos – estatisticamente, pelo menos, é-o de forma inegável. Sou um fã de Pauleta, sempre o fui, não só devido às suas características inatas como finalizador mas também devido ao carácter, humildade e profissionalismo que só os grandes campeões demonstram.

Já passou por maus momentos? Claro que sim, nomeadamente no Euro 2004 e na parte final do Mundial 2006, mas qual o jogador que nunca passou? Pauleta é um exemplo para aqueles que o vão seguir, não só pela importância que teve como jogador mas também como um dos capitães de Portugal.
Depois de fazer dois golos ao Benfica, e ainda claramente magoado com alguns experts da bola, é sintomática a forma como o #9 do Paris Saint-German lançou uma provocação. “Então eu só continuo a marcar golos a equipas medíocres? Ou também acham que o Benfica é medíocre?” Brilhante!

Podem ver o resumo do jogo aqui. Magnifico vídeo da bS7.

Ficha de Jogo:

2ª mão dos oitavos-de-final da Taça UEFA

Estádio da Luz, em Lisboa

Árbitro: Florian Meyer (Alemanha)

SL BENFICA – Moretto; Nélson, David Luiz, Anderson e Léo; Petit; Katsouranis, Simão e Karagounis (João Coimbra, ao int); Fabrizio Miccoli (Derlei, 76 m) e Nuno Gomes (Paulo Jorge, 90+5 m).

PARIS SAINT-GERMAN – Michael Landreau; Mabiabala (Bernard Mendy, 74 m), David Rozenhal, Traoré e Dramé; Diané, Mulumbu, Jérôme Rothen e Marcelo Gallardo (Ngog, 70 m); Pauleta e Peguy Luyindula (Bonaventure Kalou, 70 m).

Disciplina: Amarelos a Mulumbu (1 e 87 m), Katsouranis (21 m), Rothen (60 m), João Coimbra (73 m), Nuno Gomes (90+1 m) e Traoré (90+1 m). Vermelho por acumulação de amarelos a Mulumbu (87 m).

Golos: 1-0, Simão (12 m); 2-0, Petit (27 m); 2-1, Pauleta (32 m); 3-1, Simão (88 m, de g.p.).

(O Benfica segue em frente, para os quartos-de-final da Taça UEFA, com um agregado de 4-3)

#Fotos: AFP-Getty Images, Reuters e Site Oficial

#adicionado a Crónicas 06/07

#publicado em simultâneo com o Encarnados