sexta-feira, agosto 11, 2006

Crónica 1ª Mão Pré-Eliminatória - O Calcanhar e o Aquiles!


Já muito se tinha falado, e ainda se fala, da fraca prestação da equipa do Benfica nos vários jogos de pré-temporada. O que é certo é que pela primeira vez se jogaria a sério e a contar para uma competição a sério. E aí estava um dos jogos mais importantes de todo o ano desportivo que se inicia, portanto era expectável um Benfica mais aguerrido e com mais capacidade. Acima de tudo, era exigível um Benfica competente que não colocasse tudo em causa logo nos primeiros 90 minutos da eliminatória… e ainda por cima num palco tão mítico.

Há inúmeros anti-corpos contra Fernando Santos, eu próprio não o quero como treinador do Benfica, mas é com resultados que o Engenheiro tem de provar que estamos todos – ou quase todos, errados. A primeira análise do seu trabalho não é nada positiva, situação que confirma todos os receios da “massa” benfiquista e portanto terá de trabalhar muito e de mostrar ainda mais! Em Viena aparecia o primeiro grande teste à sua capacidade de liderança.

No que diz respeito ao Áustria de Viena confesso que eram, para mim, uns redondos desconhecidos. Não conheço o Campeonato onde estão inseridos e tão pouco o plantel. Um ou outro nome chama à atenção mas pouco mais. O que é certo é que a Imprensa Nacional deu a conhecer – durante a semana – o poderio dos austríacos e mediante essa análise não deu para ficar assustado. Parece-me óbvio que o único problema do Benfica seria a própria intranquilidade interna!

O melhor escalonamento tendo em conta os disponíveis

Depois de semanas e semanas de “quadrados” e “losangos” eis que Fernando Santos opta pelo mais óbvio. Já sabíamos pelas indicações dadas pré-jogo mas o regresso da táctica utilizada nos últimos 4 anos pode ser o maior reforço do Benfica nesta época. O grande problema é que o plantel não está artilhado para o 4-2-3-1…

Em virtude das lesões – Miccoli e Léo – e dos impedimentos – Simão – o treinador do Benfica apresentou o melhor onze possível… pelo menos na minha opinião. Assim, na baliza manteve-se o melhor keeper do clube: Quim, que finalmente vê reconhecidas as suas capacidades. Na defesa, Ricardo Rocha na esquerda e Nélson na direita foram os laterais enquanto que no centro manteve-se a dupla do ano anterior, os brasileiros Luisão e Anderson – “The Twin Towers”.

Como trincos aparecem o indispensável Petit e o substituto de Manuel Fernandes: Katsouranis – a meu ver a equipa fica claramente a perder em quase todos os aspectos. Nas alas o que seria de esperar, o irrequieto Paulo Jorge e o explosivo Manú, enquanto que no apoio ao avançado Nuno Gomes esteve “Il Maestro” Rui Costa.

Fica a ideia que há algum deficit de qualidade em relação a anos anteriores e esse aspecto é preocupante.




Exibição à imagem de Fernando Santos

Com uma braçadeira preta em homenagem a Jorge de Brito, a equipa do Benfica entrou em campo muito nervosa e deixou-se dominar por completo por um Áustria ambicioso.
Os poucos adeptos lusos presentes também não ajudavam e nos primeiros 15 minutos assistiu-se a um controlo avassalador dos visitados. Não deixavam sequer “respirar”!

Mas aos 15 minutos tudo mudou, na primeira jogada de ataque do Benfica a bola chega a Rui Costa que assiste Katsouranis. O grego isola Paulo Jorge – que momentaneamente tinha trocado de ala com Manú – que espera a desorganização da defesa para entregar o esférico a Nuno Gomes. O capitão do Benfica num gesto soberbo, de calcanhar, aproveita a saída do “keeper” da baliza – foi ter com Paulo Jorge – para fazer o golo. A bola ainda toca no defesa que fazia a marcação ao #21. Um lance fenomenal!




Curiosamente, depois do golo, o Benfica apareceu melhor. Mais afoito e mais solto na partida, e até o domínio territorial mudou. Mas o futebol é mesmo assim: novamente contra a corrente de jogo, e no seguimento de um lance de bola parada, o Áustria consegue empatar. Até ao intervalo o Benfica continua a dominar e está perto do golo quer num remate de Rui Costa quer numa grande jogada de Nélson.

A segunda parte foi má demais para ser verdade. Apesar da entrada mais lúcida dos austríacos, as equipas pareciam satisfeitas com o resultado e apenas em lances esporádicos tentaram mudar o rumo dos acontecimentos. Foi um longo bocejo, onde só Petit – 2 ou 3 estoiros – e duas jogadas de desmarcação – uma de Nuno Gomes e outra do inenarrável Marco Ferreira – levantaram algum “frisson”.

Destaco as exibições de Petit, Rui Costa e Luisão.



O Pianista e o Carregador do Piano

Foi um prazer ver o controlo de jogo de Rui Costa, que se assumiu como uma das peças mais importantes – é dele que se iniciam quase todas as grandes jogadas da equipa, inclusive o golo. Fez uns primeiros 45 minutos de excelente qualidade com lances de grande espectáculo – fica na retina aquele em que finta 3 adversários – embora ainda hesite um pouco na hora do remate. No segundo tempo desapareceu do jogo confirmando que não dura os 90 minutos a um ritmo elevado – só Nandinho não viu!

No entanto, para mim, o homem do jogo é indiscutivelmente Petit, que assumiu todas as despesas do meio-campo colocando a bola disponível aos artistas. É um atleta por quem tenho grande admiração – por tudo o que representa no balneário e em campo – e que demonstra sempre uma importância vital no jogo da equipa.
A exibição não está isenta de falhas – batido no lance do golo e uns primeiros minutos muito faltosos – mas compensou com os atributos reconhecidos. Esteve perto de marcar num dos seus famosos pontapés.

Exibição imperial de Luisão, onde as falhas foram mínimas. Parece de regresso à boa forma e foi um dos responsáveis pela grande segurança defensiva demonstrada.
Uma das coisas que não gosto de o ver fazer são aqueles “balões” para a frente ao invés de jogar para o lado ou sair com a bola controlada… e neste jogo fez muitos. No entanto já deu para ver que lhe é difícil melhorar esse aspecto.



Em bom plano estiveram também Quim, Anderson e Paulo Jorge

No regresso à baliza, Quim voltou a demonstrar a segurança que todos lhe reconhecem. O que mais gosto de ver nas suas exibições é a grande tranquilidade que sai aos cruzamentos, nunca inventa e sai-se sempre bem com aqueles socos na bola. No golo austríaco não tem culpas porque lhe estão a cobrir o ângulo de visão, sendo praticamente impossível fazer algo mais. Apenas uma falha, mas de pormenor, quando tocou numa bola que ia directamente para fora, cedendo assim um canto desnecessário.

Tal como o seu companheiro de sector, Anderson fez um jogo muito positivo, embora menos espectacular que o seu compatriota. Houve um ou outro lance em que foi ultrapassado mas que não resultou em perigo devido à fraca valia do adversário.
Aquela situação de desentendimento com Petit chocou-me um pouco, apesar de só saber que realmente aconteceu aquando das declarações dos atletas. Na altura pensei que fosse algo dirigido para o adversário e como não o foi estou algo apreensivo em relação ao ambiente do balneário.

Paulo Jorge tem-se revelado uma boa surpresa. Já no jogo frente ao AEK tinha dado “conta de si” e em Viena fez uma excelente exibição. 4 assistências primorosas – a do golo, novamente para Nuno Gomes mas que de cabeça não consegue desfeitear Safar, outra para Petit chutar demasiado alto e outra para Marco Ferreira desperdiçar de forma patética.
A continuar assim pode garantir uma utilização regular, mesmo com a permanência de Simão. É relativamente jovem e acima de tudo é português!



Exibições a espaços de Nuno Gomes, Nélson e Manú.

Um golo como o que Nuno Gomes fez não está ao alcance de todos. Uma execução sublime de um jogador que já deu muito ao Benfica. Apesar do mau momento que atravessou à uns anos atrás, parece que volta ao melhor de si… àquelas épocas de muitos golos – a época anterior e o início desta assim confirmam.
No resto da partida apareceu pouco – sempre muito sozinho e colado aos centrais – e nota-se que ainda não está nas melhores condições físicas.

Na globalidade gostei de Nélson, apesar de algo frágil a nível defensivo – com um adversário de peso poderia ter comprometido – foi um autêntico foguete nas jogadas de ataque. A maior nota de destaque é uma jogada em que flecte para dentro e estoira com o pé esquerdo, com a bola a rasar o poste. Seria um golo de bandeira!

Confesso que fiquei um pouco desiludido com Manú, especialmente por ter em conta exibições anteriores. É verdade que as coisas não lhe correram bem, talvez pelo excessivo nervosismo – afinal foi uma estreia nas Competições Europeias – mas demonstra sempre muita vontade de melhorar.
Em velocidade foi praticamente imbatível, no entanto não conseguiu dar seguimento às várias jogadas perigosas que criou. Escorregou e caiu muitas vezes, as botas azuis se calhar não ajudam!



E agora, talvez as exibições menos conseguidas, Ricardo Rocha e Katsouranis.

O #33 denotou grandes dificuldades na lateral esquerda e foi bastantes vezes ultrapassado pelo extremo-direito austríaco, principalmente nos períodos de maior “forcing” do Áustria. É no meio ou em marcação homem-homem que sabe jogar e não há que inventar!
Ofensivamente, como seria de esperar, foi pouco mais que zero – situação que deixa a equipa coxa. Não deixo de dizer, no entanto, que é um jogador muito importante nesta equipa.

Não sou grande apreciador de Katsouranis, pelo menos até agora, e talvez por isso o grego tenha menor margem de manobra. Apesar do passe que dá origem ao golo ser dele na restante partida mostrou-se muito lento e principalmente muito duro: o lance que lhe dá o amarelo roça o laranja e aí acabariam as pretensões da equipa – no seguimento do livre acontece o golo austríaco.
Tem de melhorar o ímpeto com que entra aos lances ou vai ser expulso muitas vezes na Liga Portuguesa.

E por fim os suplentes Marco Ferreira, Kikín Fonseca e Nuno Assis.

Não entendo a permanência de Marco Ferreira no plantel de um clube como o Benfica. É mau demais para ser verdade e um insulto a grandes extremos-direitos que já passaram pela Luz. E quando é a primeira opção a entrar em campo está tudo dito em relação às alternativas existentes. Duas jogadas em que atrasou a bola, uma perda de bola num contra-ataque perigoso – esqueceu-se dela – e um golo inacreditavelmente falhado, a dois metros da baliza, num estupendo cruzamento da esquerda.

Fonseca e Nuno Assis entraram em campo demasiado tarde e quase nem tocaram na bola. O mexicano ainda teve um bom lance de solicitação para a lateral mas o português nem esteve em jogo.



Arbitragem segura e sem erros graves

Não foi pela arbitragem que houve problemas na partida. Tecnicamente não houve erros significativos embora me parece que por vezes o italiano Stefano Farina foi um pouco excessivo no capítulo disciplinar. Um ou dois cartões para os austríacos talvez tenham sido exagerados, no entanto pode ser que tenha tido a pretensão de “segurar” a partida antes de aparecerem problemas graves.

Trabalho impecável dos árbitros-auxiliares, quer o golo do Benfica quer o golo do Áustria são limpos em virtude de haver defesas que colocam toda a gente em jogo. Apesar dos protestos de ambos os lados não há qualquer irregularidade.
Uma boa propaganda para a arbitragem italiana que nos dias de hoje está nas “ruas da amargura”, por razões que todos conhecemos.



Na Luz para “iluminar” a época

É inegável que o jogo foi bastante fraco, e que se esperava muito mais de uma equipa com o historial do Benfica. Mas tendo em conta as anteriores performances, e as derrotas subsequentes, é possível dizer-se que se melhorou substancialmente… nem que seja pelo resultado. Mas Fernando Santos tem responsabilidades na “não-vitória” de hoje!

Não compreendo como as substituições se fizeram apenas nos últimos 20 minutos e também não entendo como Fernando Santos exclui Karagounis do lote de disponíveis, optando por 2 jogadores de características semelhantes – Diego e Beto. E assim se vê que para a posição de extremo há um deficit gritante no plantel e que vai, de certeza, criar problemas muito graves em desafios futuros.

Ainda assim penso que a fundamentação deste resultado – para além do conjunto austríaco ser fraquíssimo – esteve na segurança defensiva, onde Luisão brilhou mais uma vez. A defesa do Benfica é, de facto, o ponto forte desta equipa e se a mesma estiver no topo da sua forma é praticamente inquebrável.




O jogo fica marcado pelo “fabulástico” golo do Nuno Gomes mas é verdade que o ímpeto atacante do Benfica, e em todo o jogo, foi pouco mais que essa jogada magistral. A equipa esteve muito estática e com receio de assumir o jogo, situação que poderia complicar as contas do apuramento. Contra uma equipa da valia do Áustria de Viena – comprovou-se que lutaria para não descer na Liga Bwin – foi confrangedor assistir a um domínio completo dos visitados, embora se pudesse observar que mesmo com a bola nos pés pouco mais poderia sair dali.

Com este resultado está cada vez mais perto a qualificação para a Fase de Grupos da Champions League, mas é necessário ter muito cuidado já que é manifestamente real que esta equipa não tem metade da classe do Benfica Campeão em 2004/05 e do Benfica Europeu de 2005/06.

Dia 22, a vitória tem de ser o único resultado possível!
Vamos Benfica!

NDR: Uma palavra ainda para os patéticos comentários do locutor da SIC. Foi do início ao fim a “cascar” no Benfica, mas principalmente em Petit. Um fetiche qualquer, porventura! Confirma-se que não há a mínima hipótese de uma transmissão decente fora do âmbito da SportTV. Haja respeito!

Ficha do Jogo:

1ª Mão da 3ª Pré-Eliminatória da Champions League

Estádio Ernst Happel em Viena

Árbitro: Stefano Farina (Itália)

AUSTRIA WIEN – Safar; Troyansky, Tokic, Radomski e Papac; Wimmer (Mila, 46 m) Blanchard, Vachousek e Lasnik (Pichlmann, 82 m); Aigner (Ceh, 46 m) e Wallner.

SL BENFICA – Quim; Ricardo Rocha, Luisão, Anderson e Nélson; Katsouranis e Petit; Manú (Marco Ferreira, 69 m), Rui Costa e Paulo Jorge (Nuno Assis, 88 m); Nuno Gomes (Fonseca, 79 m).

Disciplina: Amarelos a Lasnik (35 m), Katsouranis (36 m), Radomski (43 m), Tokic (58 m), Paulo Jorge (62 m), Ricardo Rocha (66 m).

Golos: 0-1, Nuno Gomes (15 m); 1-1, Blanchard (36 m).

Fotos: Reuters

#publicado em simultâneo com os
Encarnados