quinta-feira, agosto 24, 2006

Crónica 2ª Mão Pré-Eliminatória Champions - Bem-vindos ao "Inferno" da Luz!


O empate, há 15 dias, em Viena deixou em aberto a eliminatória, embora com vantagem para o Benfica, mas o bom senso deveria garantir uma consciencialização de que em jogos europeus – e porque não dizer: em todo o fenómeno desportivo – tudo é possível. O “seguro morreu de velho” e por isso só um Benfica forte e esclarecido convenceria o espírito daqueles que pretendem o sucesso nesta época. A presença na Champions é fundamental para um clube com o colossal historial do Sport Lisboa e Benfica, e perder essa oportunidade com um clube extremamente modesto representaria um ultraje!

No meio de alguma indecisão em torno de Simão Sabrosa e do próprio Karagounis, seria importante que os atletas presentes pudessem provar que, apesar de algumas baixas de vulto, a equipa pode ser competitiva – embora algumas lacunas sejam evidentes! Cabia a Fernando Santos a liderança do grupo e a responsabilização pela motivação interna, algo a que não lhe estamos habituados a ver de forma consistente.

Por outro lado, o que esperar de um adversário tão modesto quanto inocente… e com um treinador bem peculiar. O mesmo fraco desempenho na medíocre Liga Austríaca ou a forte presença daqueles primeiros 10 minutos no Prater?
Como já foi dito por vários bloggers e jornalistas, a principal vitória benfiquista seria o “renascimento” desta equipa, o acreditar novamente que é possível uma boa prestação em 2006/07, naquele que era um dos jogos mais importantes de uma época ainda em idade infantil.


Não inventar é meio caminho andado para o sucesso

Já era expectável que Fernando Santos optasse pela “reutilização” da formação que empatou em Viena. Não só porque as estrelas lesionadas ainda não recuperaram – Miccoli, Léo e Simão, ficando no clube, serão titulares indiscutíveis – mas também porque, no momento, é esta a melhor formação que o Benfica pode apresentar. Parece óbvio à maioria dos benfiquistas!

Sendo assim, um 4-2-3-1 com a manutenção de Quim na baliza – espero que essa escolha se mantenha –, Ricardo Rocha e Nélson como laterais, fechando a defesa com a dupla internacional brasileira Luisão e Anderson.
Como trincos surgiram Petit e Katsouranis, naquele que parece ser o miolo do meio-campo para toda a época. Nas alas, os portugueses Paulo Jorge e Manú, enquanto que Rui Costa serviu de apoio ao único avançado: o capitão Nuno Gomes.

De destacar a presença de 8 portugueses no 11 inicial, com 5 deles internacionais A por Portugal.


Um domínio esmagador

A entrada do Benfica na partida foi o sinal que seria muito difícil perder a eliminatória. Tal como previa a faixa dos Diabos Vermelhos, o Benfica “carregou” no adversário de forma esmagadora e foi Ricardo Rocha, com duas iniciativas individuais, que criou maior perigo nos primeiros 5 minutos. Aos 9 minutos, numa jogada de fino recorte, Rui Costa coloca a bola na cabeça de Nuno Gomes que faz um cabeceamento fantástico para a defesa da noite do keeper austríaco.

A solução dos visitantes era, quase exclusivamente, o recurso à falta e tal era aproveitado para criar mais perigo. Anderson e Petit foram, então, os protagonistas nas bolas paradas. Aos 20 minutos acontece a primeira explosão de alegria! Nuno Gomes recebe um excelente cruzamento de Manú e amortece para Rui Costa que, vindo de trás e à entrada da área, desfere um remate forte e colocado… indefensável! A comemoração do golaço de Rui Costa é algo indescritível e só visto é possível vislumbrar o momento.

Depois do golo a já atarantada equipa de Viena perdeu a noção do jogo e consentiu várias oportunidades de golo ao Benfica. Paulo Jorge e Nélson na cara de Safar, Katsouranis de calcanhar no seguimento de um canto e ainda um remate de Rui Costa, já dentro da área, não conseguem aumentar o marcador. Mas quando já toda a gente se preparava para o intervalo, Katsouranis ganha de cabeça a meio campo e a bola acaba por sobrar para Nuno Gomes que galga 30 metros e, com frieza, fuzila Safar para o merecido 2-0.


A 2ª parte foi a confirmação do 1º tempo. Uns primeiros minutos de forte aperto para o Áustria e com Paulo Jorge a revelar a sua veia perdulária por 2 vezes.
Como resposta ao único lance perigoso dos visitantes – grande defesa de Quim, para canto – o Benfica faz o 3-0. Contra-ataque venenoso – a aproveitar o referido canto – com passe magistral de Rui Costa a isolar Manú, Petit e Nuno Gomes, com o #18 a oferecer de forma generosa o golo ao #6.

Na jogada do Benfica imediatamente s seguir Nuno Gomes falha o 4-0, já dentro da pequena área, devido à atenção de Safar. À hora de jogo o ritmo da partida baixa consideravelmente e com a ovacionada substituição de Rui Costa – pouco depois dos 65 m – já toda a gente esperava pelo final.
Até ao fim do jogo destaque apenas para uma ou outra iniciativa individual de Nélson, para um lance genial de Manú – a fintar sucessivos adversários até ser travado em falta – e para um lance perigoso do Áustria de Viena, no seguimento de uma perda de bola de Beto – de cabeça e digna de um iniciado.


58 mil embalados ao som da “música” do Maestro

Falar das melhores prestações em campo é relativamente fácil e, se Petit e Luisão foram os esteios do costume, a exibição de Rui “Il Maestro” Costa foi qualquer coisa de sensacional! No regresso à Luz em jogos oficiais, o #10 do Benfica não podia ter tido melhor “sorte”. Futebol de “cabeça levantada”, passes sublimes, um sem número de grandes jogadas individuais e… um golaço, gritado a plenos pulmões! Apesar da excelente prestação da maioria dos atletas, Rui Costa foi um espectáculo dentro do próprio espectáculo. E o que dizer daquela comemoração “à Benfica”?

Em grande plano exibiram-se, os já citados Petit e Luisão, mas também Nuno Gomes e Nélson.

A exibição de Luisão tem apenas uma classificação: perfeita! Não há uma mácula que se lhe possa apontar e, embora o adversário seja manifestamente fraco, nalguns momentos foi mesmo confrangedor assistir às tentativas de ataque do Áustria de Viena, tal a espectacularidade com que lidou com a situação. Um autêntico “stopper” que não deu uma única hipótese a Wimmer, Ceh e companhia! Parece caminhar para um grande aprumo de forma e até voltou a merecer a confiança de Dunga, no “escrete”.

A importância de Petit no Benfica é por demais evidente. Um Benfica com Petit raramente é um “petit” Benfica e a noite europeia até deu para facturar.
A excelente circulação de bola da norma, o “pressing” continuado e o mais alto possível mas acima de tudo, uma a firmeza “à patrão”. Apesar da fraca pontaria nos “tiros” de longe, realizou uma partida excepcional.
Saiu tocado, espero que não seja nada de especial!


A importância de Nuno Gomes no Benfica viu-se bem no decorrer desta eliminatória: dois golos e 1 assistência são o pecúlio do capitão do Benfica. Bastante bom, portanto!
Na posição que ocupa é fulcral que assuma as despesas do ataque, não pode ficar esquecido, pelo que procurar a bola é a missão nº1. Missão cumprida, obviamente!
Autor de um golo importante, não tão soberbo como o no Prater, que sentenciou definitivamente o vencedor do jogo e da eliminatória.
Noutro momento de grande espectáculo executou um fantástico cabeceamento que já toda a gente gritava golo quando Safar “safou” a inauguração do marcador. Impecável nas tabelinhas com os colegas como, aliás, é seu timbre.

Foi um Nélson em grande que surgiu na Luz. As saudades das “arrancadas”, das fintas estonteantes e dos cruzamentos milimétricos já eram grandes e com o aprumo do factor físico parece que essas “nuances” vieram para ficar.
Claramente a melhor exibição que fez nesta época, deixando “água na boca” dos adeptos. Se mantiver o nível exibicional confirmar-se-á como um caso sério no panorama nacional.


A um bom nível referencio Anderson e Katsouranis.

A “zaga” que faz com Luisão é de grande qualidade, e Anderson contribui bastante para isso. Sempre com tranquilidade e classe – naquela que é a melhor dupla “encarnada” em mais de 10 anos – deu seguimento à excelente exibição de toda a defensiva. Em virtude do fraco acerto ofensivo dos austríacos teve muito espaço para aparecer nalguns lances de bola parada, ao seu estilo, com algumas tentativas de cabeceamento que acabaram por sair frustradas. A noite foi de segurança, imagem de marca do #3.

Depois de um início algo periclitante, o internacional grego Katsouranis poderá ficar satisfeito com o que fez em campo. Embora na “sombra” de Petit, esteve sempre presente e fez mesmo alguns cortes espectaculares. Uma das notas mais positivas para a sua presença na equipa titular é a estupenda capacidade física que possui, atributo esse que lhe permite assumir o jogo aéreo de forma consistente… e era essa uma grande lacuna do meio-campo. A assistência para o 2º golo demonstra essa vertente de forma bem vincada!

Apesar do pouco trabalho, Quim teve noite segura. Poucas intervenções mas a normal eficácia nos cruzamentos. Brilhou a remate de longe de Wallner já que com a bola a bater na relva a defesa tem elevado grau de dificuldade.
Apenas uma falha: deixou bater no chão uma bola perdida, sozinho, e esta fugiu-lhe por breves segundos… pregou um susto, mas só isso!


Pouco trabalho para Ricardo Rocha no dia em que, quase três anos depois, voltou a ser convocado por Scolari para os AA – e tão justa é essa convocação! A posição de lateral-esquerdo não lhe favorece os rasgos atacantes mas, por vezes, foi surpreendente a forma como o conseguiu fazer... acho que nunca o tinha visto a rematar de longe. Defensivamente impecável e às vezes eram dois que por lá passavam.

Paulo Jorge e Manú têm estilos muito díspares. O 1º tem na raça a sua vertente mais positiva e o 2º é na velocidade que se destaca. Não se podem considerar estrelas mas são jogadores bastante úteis a este Benfica.
Não fizeram exibições de indiscutível classe mas foram importantes na manobra da equipa, cada um ao seu jeito. Nalguns momentos as suas pechas vieram ao de cima, nomeadamente o pendor perdulário de Paulo Jorge – a culpa será, talvez, mais de Fernando Santos que o coloca muito em cunha com Nuno Gomes – e algum individualismo excessivo de Manú.
O #18 esteve, no entanto, um pouco melhor que o seu colega já que é responsável por várias “arrancadas” no lado direito e uma assistência primorosa para Petit fazer um golo. A Paulo Jorge pede-se mais tranquilidade e mais apuro na finalização… o resto está lá!


E por fim os suplentes Kikín Fonseca, Beto e Mantorras.

Foi dada pouca margem de manobra aos suplentes utilizados e mesmo Kikín – o que teve mais minutos – teve poucas oportunidades de se mostrar. Não só pelo facto de o cariz do jogo ter-se alterado – em virtude da vantagem alcançada e da substituição de Rui Costa – mas também porque a excessivamente compacta defensiva do Áustria lhe deu pouquíssimo espaço. Ainda assim, consegue-se ver facilmente que a sua “protecção de bola” é exímia.

Se Mantorras quase não tocou na bola, em virtude dos singelos 5 minutos de utilização, a entrada de Beto correspondeu ao pior momento da equipa em todo o jogo. Facilmente constatável a inépcia do brasileiro em assumir as despesas do jogo até aí encarregues a Petit. Talvez nesse pormenor se tenha visto a importância fundamental do #6 do Benfica. Com Beto há alguns cortes interessantes – que a meu ver não justificam a sua permanência no plantel – mas não há passes em profundidade, não há remates perigosos nem circulação de bola visível. O miolo do meio-campo precisa de alternativas que o sejam, mesmo!


O árbitro que não se viu

O melhor elogio que se pode fazer à prestação de um árbitro é dizer que a sua presença foi pouco notada. E, de facto, Terje Hauge demonstrou a sobriedade necessária para controlar, de forma eficaz, os jogadores em 90 minutos de futebol. É verdade que o jogo não teve um cariz de grande dificuldade mas o norueguês fez por não complicar aquilo que já era fácil.
Tecnicamente impecável e disciplinarmente irrepreensível, até os auxiliares ajudaram à sua boa performance. Com 5 amarelos “austríacos” castigou a excessiva dureza dos visitantes!


4 meses depois, o regresso ao convívio dos grandes

Um ambiente resplandecente com mais de 58 mil almas e o mítico “Inferno” da Luz de regresso. Que saudades de um jogo de futebol “a sério”, com um Benfica como o protagonista máximo em campo! A “malapata” dos maus resultados e das exibições sofríveis foi finalmente quebrada e já há muito tempo que não víamos uma prestação tão convincente e esplendorosa por parte do Benfica. Felizmente que até ao momento, nas partidas de carácter oficial, a equipa não tem vacilado.

É de destacar que o vencedor do jogo nunca esteve em causa e que desde o 1º ao último minuto houve um domínio territorial, exibicional e emocional, sempre por parte da equipa da casa. Houve, mesmo, alguns largos minutos de massacre completo onde os jogadores da fraca equipa do Áustria não sabiam o que fazer e ficavam apenas a “assistir” ao desenrolar da partida.


Apenas uma nota negativa na noite de hoje: é inconcebível que um jogador do Benfica seja assobiado em casa, pelos próprios adeptos, por qualquer motivo que seja, e ainda mais incrível essa situação se torna se os assobios acontecem quando o atleta está prestes a entrar em campo. Compreendo que não se goste do Beto, eu pessoalmente detesto, mas assobiar um dos nossos? Simplesmente lamentável que algumas pessoas não saibam apoiar a equipa condignamente!

É inegável que o adversário do Benfica é bastante fraco – como já todos pudemos confirmar, no entanto há uma grande dose de mérito na forma como se abordou a partida e na forma como se assumiu, de forma vincada, as despesas do jogo e da própria eliminatória. Era esta a exibição porque todos os benfiquistas esperavam… e desesperavam! O Benfica não desiludiu e confirmou aquilo que todos nós queríamos: uma nova presença na Champions League.


Uma prestação idêntica à do ano transacto já será muito bom, mas a certeza de poder ver mais 6 jogos do clube, numa Competição tão importante, é motivo para um adepto ficar muito feliz. Faço votos que tudo tenha “entrado nos eixos” de vez!

Daqui a pouco realiza-se o sorteio da Fase de Grupos, eu como sou sempre a favor das “vinganças” desejava este para o Benfica:

Milan – 62/63, 89/90 e 94/95;

PSV Eindhoven – 87/88 e dar uma “liçãozinha” ao Koeman;

Anderlecht – 82/83 e 2004/05;

Não há que ter medo dos clubes milionários!
Sempre em frente, Benfica!

NDR: Será que são só os clubes portugueses que não têm as famosas “estrelinhas” – representativas do número de Campeonatos ganhos – por cima do símbolo do clube? Se até um clube modesto como o Áustria de Viena tem, porque será que em Portugal não se implementa este bonito pormenor?

Termino com a disponibilização do vídeo do jogo, da autoria do grande Xander, moderador do fórum A Voz da Águia.


Ficha do Jogo:

2ª Mão da 3ª Pré-Eliminatória da Champions League

Estádio da Luz, em Lisboa

Árbitro: Terje Hauge (Noruega)

SL BENFICA – Quim; Nélson, Luisão, Anderson e Ricardo Rocha; Petit (Beto, 74 m) e Katsouranis; Manú, Rui Costa (Kikín Fonseca, 65 m) e Paulo Jorge (Mantorras, 84 m); Nuno Gomes.

AUSTRIA WIEN – Safar; Troyansky, Mario Tokic, Delano Hill e Sasa Papac (Schicker, 29 m); Arkadiusz Radomski e Jocelyn Blanchard; Wimmer, Nastja Ceh (Pichlmann, 53 m) e Sebastian Mila (Lasnik, 46 m); Wallner.

Disciplina: Amarelos a Milla (18 m), Radomski (44 m), Schicker (74 m), Tokic (81 m) e Wimmer (85 m).

Golos: 1-0, Rui Costa (20 m); 2-0, Nuno Gomes (45 m); 3-0, Petit (56 m).

Fotos: AFP - Getty Images, Record e SerBenfiquista

#adicionado a Crónicas 06/07

#publicado em simultâneo com o Encarnados