domingo, junho 11, 2006

Crónica 1ª Jornada Grupo D - Lusofonia do Nosso Contentamento!


Muita emoção, muito nervosismo e acima de tudo muita fé! O confronto lusófono e histórico entre Portugal e Angola alimentou milhões de almas desejosas de sentir orgulho da sua nação. É sabido que o 1º jogo é sempre muito importante e se recuarmos 4 anos, verificamos a tragédia que foi perder com o EUA no Mundial 2002. Derrota essa que limitou as hipóteses de qualificação no Oriente.

O seleccionador de Portugal tem sofrido da imprensa e de muitos “portugueses”o maior ataque a um técnico de que há memória na história do futebol português. Mas o que é certo é que Scolari, contra tudo e contra todos, elevou Portugal aonde nunca tinha estado. A selecção tem estado coesa e ambiciosa como poucas vezes esteve em quase 100 anos de competição.

Por outro lado, Angola não tem mostrado, nos mais recentes jogos amigáveis, um grande fulgor competitivo. Inclusivamente, tem padecido de uma certa ingenuidade individual e colectiva. É verdade que em jogos deste calibre não há equipas fáceis mas a única coisa que se pode exigir a Portugal é vencer. Nem que seja por 1/2 a zero!
Acima de tudo, esperar-se-ia de Angola uma forte atitude, nunca desistir e fazer o “jogo da vida”. Neste ponto é preciso ter muito cuidado, até porque já houve surpresas na competição.


O meio-campo desejado vs indisponibilidade de Deco

Luís Felipe Scolari apostou nalgumas surpresas. Mas boas surpresas! Infelizmente Deco não pôde jogar – foi decidido não arriscar a utilização do atleta em virtude da sua limitação física – e foi, assim, substituído posicionalmente pelo capitão Luís Figo. Os anos já lá vão e Figo já não tem a velocidade de outros tempos, embora mantenha toda a técnica e enorme categoria que lhe permitem jogar no centro do terreno com grande classe.

A grande dúvida residia nos restantes 2 elementos do meio-campo. Especulava-se com Costinha e Maniche – claramente fora de forma, o que deu lugar a ataques cerrados de todo o lado a Scolari – mas a aposta recaiu em Petit e em Tiago, que são, talvez a par com Figo e Pauleta, os dois jogadores de Portugal em melhor forma de todos os 23.

A restante equipa foi a esperada, com Ricardo na baliza, Miguel a lateral-direito, Meira e Ricardo Carvalho como centrais e Nuno Valente na lateral esquerda. Nas alas jogaram Cristiano Ronaldo e Simão. O capitão do Benfica entrou no 11 aproveitando a lesão de Deco… nada de anormal. Na frente jogou o melhor marcador de sempre de Portugal: Pauleta!

Acho a equipa apresentada excelente e, caso fosse treinador – e em virtude da lesão de Deco, seria precisamente esta a que escolheria para entrar em campo.



Marcar, dominar e controlar

Primeira nota de destaque, a entoação dos hinos nacionais. Sou suspeito para falar mas acho “A Portuguesa” o hino mais fantástico de todos aqueles que conheço. Uma canção fabulosa que arrepia e faz acordar todas as emoções e sentimentos patriotas. Sou sincero… comovi-me bastante!

O arranque de Portugal foi, verdadeiramente, demolidor. No 1º minuto Simão tem uma jogada fantástica que isola Pauleta, o açoriano não faz golo por centímetros. Na jogada seguinte, o momento tão esperado. Figo arranca do meio campo e passa por todos de forma sublime, a assistência para Pauleta é brilhante e o #9 não perdoa. Golo de Portugal!


Angola não acerta as marcações e Pauleta quase bisa aos 14 minutos numa saída algo precipitada de João Ricardo. Nos primeiros 25/30 minutos o controlo do jogo foi totalmente de Portugal com poucas incursões ofensivas dos africanos. Angola viu-se apenas em remates de muito longe – Figueiredo e Mendonça – e nalgumas bolas bombeadas para Akwá.

Os minutos finais da 1ª parte permitiram ver uma Angola espevitada e com ambição. Gostei bastante dessa atitude, que infelizmente não se viu em todas as equipas que já jogaram na Competição até ao momento. Destaque ainda para um remate espantoso de Cristiano Ronaldo à trave – no seguimento de um canto de Figo – e para novo remate fortíssimo de Ronaldo – numa brilhante jogada de Miguel – para defesa de um seguríssimo João Ricardo.


Depois de uma excelente primeira parte – jogadas bonitas, remates e alguma velocidade – o jogo esmoreceu um pouco. Angola estava um pouco receosa do 2-0 e Portugal do 1-1. Talvez por isso o 2º tempo não tenha correspondido às expectativas que todos ansiavam.
Há que evidenciar que Portugal, em momento algum, perdeu o controlo total da partida

Pouco futebol rápido, e muita ansiedade caracterizaram o futebol jogado até ao final da partida. Portugal apareceu, apenas, nalgumas iniciativas de Pauleta e num ou outro remate fraco de Tiago. O meio-campo nacional começou a perder algum fulgor, o que levou Angola a apostar no ataque e em… Pedro Mantorras.

Scolari respondeu com o refrescamento total do meio-campo que acabou por conseguir segurar o resultado até ao fim. Mateus – o da polémica nacional da semana – ainda assustou Portugal mas Ricardo defendeu com segurança. Destaque positivo, ainda, para uma fantástica “bomba” de Maniche que o guarda-redes angolano atirou para canto.

Destaco as exibições de Luís Figo, Miguel e Petit.



Figo cada vez mais vintage

Começo por falar da extraordinária prestação de Luís Figo, o melhor em campo. O encontro com o Luxemburgo já o fazia prever mas não era muito provável, aos 33 anos, aparecer um Figo tão preponderante como aquele que um dia foi considerado o melhor jogador do Mundo. Pois, mas foi isso que aconteceu! Figo foi o pêndulo de Portugal… como estávamos à espera que o fosse, para o bem ou para o mal. Construiu, destruiu, cruzou, fez tudo bem. Até a defender no centro do terreno esteve impecável.
A jogada em que oferece o golo a Pauleta é a síntese da exibição do capitão. Muito orgulho do #7 de Portugal! Deco faz muita falta mas Figo… é Figo!

Já tinha saudades de ver um Miguel “à Benfica!” O jogador do Valência fez dos melhores jogos por Portugal que tenho memória. Expedito a atacar e seguro a tapar o espaço a Mendonça – um dos melhores angolanos. Está numa das melhores jogadas do jogo ao arrancar, poderoso, pela direita para assistir Cristiano Ronaldo que estoirou para João Ricardo brilhar. O #13 de Eusébio pesa muito mas Miguel aguentou-se com estilo!

A forma de Petit é brutal, esplêndida mesmo! Se no Benfica é o pivot do meio-campo, hoje também o conseguiu ser. Menos afoito ofensivamente em virtude da posição mais recuada – em relação ao que faz no SLB – mas imperial defensivamente. Por curiosidade contei o número de faltas que cometeu: fez três mas só duas existiram. O “sarrafeiro que não sabe dar um chuto numa bola” fez um grande jogo e foi dos melhores. Grande Petit!


Em bom nível exibiram-se também o guarda-redes Ricardo, Tiago e Pauleta.

Ricardo mostrou muita segurança e só por isso já merece nota positiva. Não teve muito trabalho mas quando foi preciso estava no sítio certo. Um ou outro cruzamento bem seguro mas o grande destaque vai para a portentosa defesa a remate, de longe, de André. Mesmo a acabar, estava bem posicionado para evitar que Mateus deixasse em lágrimas mais adeptos e não só os do Belenenses.

Parece-me que Tiago entrou muito nervoso. Nos primeiros minutos perdeu bastantes passes e pareceu-me preso de movimentos – valeu Petit nas sobras. Provavelmente já não está habituado a jogar tão recuado e a prova é que quando subiu no terreno – na 2ª parte – foi dos melhores. Tentou o golo por várias vezes mas um azar chamado João Ricardo nunca o deixou festejar. No cômputo geral a exibição é bastante positiva.

Não peçam a Pauleta para fintar meia equipa porque ele não o sabe fazer, mas se lhe pedirem golos, ele dá-os de bom agrado. Foi mais um a juntar aos 46 da conta pessoal, e um golo tão importante que dá 3 pontos fulcrais. O açoriano foi o mais rematador de Portugal e merecia mais um golo porque batalhou – as coisas, é verdade, nem sempre correram bem – e porque está lá sempre para ajudar Portugal. Um jogador de grande carácter que admiro muito!


Com exibições regulares estiveram Ricardo Carvalho e Nuno Valente. O central do Chelsea é muito estável, raramente comete erros graves e constrói o seu jogo numa tranquilidade invejável. Ganhou bastantes lances mas esteve desinspirado no momento de sair para o ataque. No aproveitamento do jogo aéreo nas bolas paradas também não existiu.

Tinha algum receio na forma física de Nuno Valente. Verifiquei que não havia motivo para tal, já que fez um jogo bastante bom. Muito seguro no momento de segurar Zé Kalanga – uma das estrelas de Angola – e ainda com tempo para subir no terreno para cruzar em boa conta. Nota negativa apenas na despropositada entrada de tesoura sobre Mantorras e que lhe custou um cartão amarelo evitável.


As prestações menos positivas talvez tenham sido a de Cristiano Ronaldo e a de Fernando Meira. Não quero com isto dizer que tenham estado mal, como é óbvio, mas pelo que se esperava pode-se dizer que há uma pontinha de desilusão.

O “alemão” Meira teve alguns problemas com Akwá e depois com Mantorras. O problema residiu no facto de deixar algum espaço aos avançados angolanos, espaço esse que felizmente não foi aproveitado. Ainda assim fez alguns cortes bastante importantes e, acima de tudo, não inventou: qualquer problema, bola fora de campo.

Esperava muito de Cristiano Ronaldo e pode-se dizer que o #17 foi infeliz. Para além do cartão amarelo algo injusto, João Ricardo e a barra impossibilitaram os festejos de um golo. Excessivamente individualista e com algum sobrancerismo foi bem substituído por Scolari. A sua reacção à substituição incomodou-me bastante!

Confesso que me irritei com Simão Sabrosa. Extremamente rápido – o mais veloz de todos – mas muito trapalhão, como nunca o foi no Benfica. Aos 15 segundos de jogo assistiu, de forma brilhante, Pauleta mas o #9 falhou por pouco. Infeliz nos livres e nos duelos individuais – venceu muito poucos – mas muito eficaz em termos defensivos. Para mim, a maior desilusão mas apenas porque espero muito dele!

E por fim os suplentes Costinha, Maniche e Hugo Viana.

Costinha entrou muitíssimo bem na partida, não falhou um único passe e ganhou inúmeras bolas no meio-campo – de cabeça, de carrinho, de quase todas as formas. O “Ministro” parece-me uma óptima solução de banco para segurar resultados já que pode perfeitamente fazer companhia aos centrais. Surpreendeu-me pela positiva!

Ao contrário de Costinha, Maniche entrou bastante mal. Nos primeiros minutos perdeu logo duas ou três bolas que deram origem a contra-ataques perigosos de Angola. De positivo apenas o estoiro de 30 metros que daria um golo de bandeira. Se não tem feito esse remate teria tido uma estreia em Mundiais perfeitamente desastrada.

Hugo Viana esteve menos de 10 minutos em campo, nos quais tocou 3/4 vezes na bola, sem qualquer nota de destaque.


Alguns erros em prejuízo de Portugal

Conhecido dos portugueses por uma miserável e comprometedora prestação num recente Once Caldas – FC Porto, o árbitro uruguaio Jorge Larrionda não cometeu erros com influência no resultado. Amarelou bem, quando o devia fazer, mas fica na ideia que deixou passar algumas faltas em claro, principalmente de angolanos.

Há um lance, na 2ª parte, em que Figo joga a bola por um lado de um defesa para ir buscar do outro, e que depois cai inapelavelmente na área. Pareceu-me contacto para penalty mas como não houve repetição, nem houve comentários dos relatadores, deve ter sido só uma impressão do momento.

Trabalho impecável dos árbitros-auxiliares… até porque houve pouquíssimos foras-de-jogo.



3 pontos no saco

A estreia de Portugal foi, para muitos “portugueses”, uma valente dor de cabeça.
Tudo começou na inclusão dos jogadores preferidos por todos no meio-campo da selecção. Por aqui já se sabia que não podiam achincalhar Scolari de forma coerente!
Logo nos primeiros minutos, o tal que “não marca a ninguém que interesse e nunca em grandes competições”, faz o 1-0. Esse mesmo, o açoriano Pauleta a calar tanta gente e a dar alegria a muitos mais.

Depois, Luís Figo, “aquele que já não joga nada, está velho e só anda a chular Portugal” faz uma exibição monumental e é coroado “Man of The Match” pela FIFA.
E por fim, se tudo o que tinha acontecido em 90 minutos já não chegava para enervar tanta gente, a FIFA coloca graficamente na TV a temperatura do ar. Nada mais nada menos que uns “envergonhados” 31º! Parece que em Évora até estiveram 25º… E agora, ninguém diz nada?

O tal seleccionador que “não fez nada por Portugal”, confirmou – estatisticamente – que é o melhor seleccionador de sempre da “equipa das quinas”. Mais vitórias, maior número de jogos sem perder e melhor classificação numa competição sénior. A melhor noticia que me podiam dar, amanhã, era a que Scolari tinha renovado contrato por, pelo menos, mais dois anos.


Obviamente que os 3 pontos são muito importantes, colocam Portugal na liderança do grupo – partilhada com o México – e tranquilizam jogadores, técnicos e apoiantes para os próximos confrontos. Uma vitória no próximo jogo, contra o acessível Irão, deverá garantir a selecção na fase seguinte.

Ainda há muitos que têm saudades dos tempos antigos, de Oliveira, Artur Jorge e de prestações miseráveis e indignas do nosso país. São esses os “angolanos” de hoje, os “iranianos” da próxima jornada e os “mexicanos” do último confronto do grupo. Vejam lá se não têm de mudar de país mais do que 3 vezes!

Força Portugal!


NDR: No início do jogo, vi um cartaz com qualquer coisa deste género: “Onde estás tu, Grécia? Futebol defensivo vá para casa!” Fantástico, os meus parabéns ao autor que deve ter colocado os gregos em polvorosa.

Perfeitamente idiota e lamentável a campanha que alguma Imprensa já está a fazer, denegrindo a exibição de Portugal e achincalhando os atletas que ganharam. Devem sentir falta do EUA 94, do França 98 e do Coreia/Japão 2002.

Com estes "jornaleiros", que não percebem nada, se fosse eu a mandar fazia como a Itália Campeã do Mundo em 1982: blackout total, só presentes nas conferências de imprensa obrigatórias!

Ficha do Jogo:

Campeonato do Mundo - Grupo D (1ª jornada)

Estádio Rhein Energie, em Colónia

Árbitro: Jorge Larrionda (Uruguai)

ANGOLA: João Ricardo; Locó, Jamba, Kali e Delgado; Figueiredo (Miloy, 80 m) e André Makanga; Mateus, Zé Kalanga (Edson, 70 m) e Mendonça; Akwá (Mantorras, 60 m);

PORTUGAL: Ricardo; Miguel, Fernando Meira, Ricardo Carvalho e Nuno Valente; Tiago (Hugo Viana, 82 m) e Petit (Maniche, 72 m); Luis Figo, Simão Sabrosa e Cristiano Ronaldo (Costinha, 60 m); Pauleta;

Disciplina: Amarelos a Cristiano Ronaldo (27 m), Jamba (28 m), Locó (45+2 m), André Makanga (52 m), Nuno Valente (79 m);

Golos: 0-1, Pauleta (4 m).

Fotos: AFP – Getty Images

#publicado em simultâneo com os Encarnados