“I had a perfect dream!” É como começa a letra de uma música genial de Freddy Mercury intitulada “Barcelona”. Certamente foi este o sentimento de muitos daqueles que sonhavam que o Benfica eliminasse o grande favorito à vitória final na competição, FC Barcelona.
Tarefa hercúlea que só poderia ser concretizada com um misto de classe, sorte e atitude. O majestoso Camp Nou aguardava os “novos heróis” do Benfica e a sua falange de adeptos mais fervorosa – uns 5000 no topo mais longínquo do 3º anel. O nulo na Luz depois de um massacre de oportunidades forasteiras mas com uns excelentes 30 minutos finais “dos da casa” acalentava alguma esperança numa vitória ou num empate salvador. “Tudo é possível!” diziam uns, “Queremos uma goleada!” diziam outros, “Já estamos nas meias-finais!” invocava a facciosíssima imprensa catalã.
Ronald Koeman apostou na equipa prevista por todos. Apenas duas alterações no 11 titular: a 1ª retirando o lesionado Nuno Gomes e reforçando o meio campo com Beto; a 2ª retirando Karagounis, numa clara fé na velocidade de Geovanni. Até aqui a aposta pareceu-me bastante correcta já que era esta a equipa quase unanimemente pretendida – eu incluído. Certamente que na 2ª parte se pretenderia colocar o grego Karagounis como forma de controlar o jogo em busca da vitória. Se a escolha dos jogadores não merece contestação, a opção de Koeman na colocação de Simão ao centro é de bradar aos ceús.
Iniciou-se a partida com um claro domínio de jogo do Barça que pretendia o mais rápido possível inaugurar o marcador para assim gerir o resto do jogo com mais à-vontade. Mais uma vez o Benfica revelou-se demasiado medroso e intranquilo para conseguir segurar os ataques da equipa da casa e contra-atacar de forma coerente e conseguida. Aos 4 minutos parecia que toda a estratégia iria por água abaixo com a marcação de uma grande penalidade. Moretto esteve enorme e evitou o golo de Ronaldinho mas não o conseguiu um quarto de hora mais tarde. O controlo de jogo e oportunidades de golo materializaram-se no golo do melhor do Mundo após uma inacreditável falha individual – mais uma de Beto – mas num total desacerto colectivo. O massacre continuou até ao intervalo sem que o Benfica tivesse feito um único remate à baliza de Valdés. Domínio avassalador, portanto!
Com a chegada da 2ª parte, a mentalidade dos jogadores alterou-se de forma significativa. Pareciam menos impressionados com o ambiente e responsabilidade e com mais vontade de procurar um resultado. Karagounis foi fundamental nesse aspecto pelo facto de ter conseguido segurar a bola por mais algum tempo na posse do Benfica – até à sua entrada o Benfica foi confrangedoramente frágil.
A verdade é que o Benfica teve algumas oportunidades mas o domínio real continuou a ser catalão. Quando Simão teve aquela grande oportunidade depois de uma grande jogada de Miccoli dei comigo aos gritos e aos saltos de euforia. Foi preciso alguém dizer-me que a bola tinha ido às malhas laterais para que continuasse na realidade e não no sonho. Porra! Que grande lance, dar-nos-ia a qualificação certamente!
A partir daqui o Barcelona tremeu um pouco e o Camp Nou intranquilizou-se de forma significativa. Toda a gente sabia que um golo eliminaria o Barcelona e as jogadas de perigo do Benfica aliados aos sucessivos falhanços dos jogadores da casa faziam temer o pior. A felicidade não esteve, mais uma vez, connosco e quando se procurava o golo do empate surgiu o selo final da eliminatória com a assinatura de Samuel Eto’o – aproveitando nova falha individual desta feita de Petit. Grande tristeza, não merecíamos morrer na praia depois de tanto sofrimento e… em dois jogos!
Mais uma vez ficamos com a ideia que Koeman não fez tudo ao seu alcance no que diz respeito às substituições. A aposta em Karagounis deveria ter sido mais cedo – não o colocar logo depois do intervalo é uma aberração – enquanto que apostar em Laurent Robert – péssima forma e pouco poder de luta – e Marcel é um absurdo. O ponta-de-lança brasileiro há semanas que não jogava, está sem ritmo, e nunca poderia tirar o lugar a Pedro Mantorras que para além de ser talismã tem marcado em jogos bem importantes e nos últimos minutos.
Individualmente gostei imenso de Luisão e de Moretto.
Moretto salvou o Benfica exibindo-se com grande categoria e classe. Não teve uma única falha durante todo jogo e fez duas defesas fantásticas. A 1ª defesa soberba aconteceu na marcação do penalty por parte de Ronaldinho e a 2º aconteceu com os pés num lance de golo eminente de Van Bommel. Foi um transmissor de segurança e é isso que se lhe pede há meses. Sai, certamente, valorizado desta eliminatória e com a confiança reforçada para “atacar” o resto da Liga e consequentemente evidenciar a sua importância no plantel do Benfica. Não foi por ele que o Benfica foi eliminado muito pelo contrário.
O defesa-central brasileiro Luisão demonstrou mais uma vez à Europa todo o seu valor. De longe, o melhor em campo por parte do Benfica, foi dos poucos que não se deixou atemorizar pela importância do jogo e poderio do adversário. O #4 foi enorme, salvou muitas jogadas de aflição e ainda esteve nalguns lances de ataque mais perigosos. Os 10 jogos completos que realizou nesta competição foram uma verdadeira montra para os grandes clubes que perseguem a sua contratação.
Gostei bastante de Léo, Karagounis, Manuel Fernandes e Fabrizio Miccoli que se exibiram muito positivamente.
Léo teve algumas falhas que habitualmente não costuma cometer – passes errados em zonas mais ou menos comprometedoras – ainda assim foi sempre dos mais inconformados quando teve a oportunidade para subir no seu flanco. Defensivamente deu pouco espaço a Larsson mas o mesmo foi retribuído pelo sueco em lances opostos. Na primeira parte, foi dos poucos com o discernimento para fazer passes arriscados e ambiciosos. As suas declarações no final da partida enchem-me de orgulho como adepto.
Os 35 minutos de Karagounis foram o que seria de esperar. Controlo de bola exemplar e a procura do remate de fora da área. A entrada do grego foi fundamental na tentativa do Benfica se libertar da enorme pressão a que estava sujeito. Está ligado aos dois lances mais perigosos do jogo ao lançar Miccoli na jogada do remate de Simão e está perto do golo num remate na sequência de um livre com o jogo mesmo a terminar. Fica-me na ideia que teria tido maior importância com mais minutos de jogo.
Manuel Fernandes foi o melhor elemento do meio campo do Benfica. Embora menos acutilante a nível ofensivo do que o normal foi o responsável por algumas recuperações de bola espectaculares – aquela de carrinho a ceder canto é fantástica. Algo confrangedor o facto dos seus companheiros muitas das vezes não procurarem abrir linhas de passe dificultando-lhe a entrega da posse de bola depois de uma ou outra recuperação.
Com um meio-campo de luxo do adversário o jovem benfiquista nunca se deixou atemorizar e quando se preparava para incutir alguma velocidade ao meio-campo… foi substituído por Marcel. Poderia e deveria ter saído outro jogador!
Quanto a Miccoli mais do mesmo: classe, velocidade e acima de tudo atitude. Miccoli é verdadeira magia do futebol, um génio que mesmo com pouco espaço e ainda menos bola conseguiu desenvolver os melhores lances de ataque do Benfica. Muitos foras-de-jogo assinalados onde se fica com a ideia que até ao desamparado fiscal de linha trocou os olhos – pelo menos metade foram mal assinalados!
Em bom nível também esteve Ricardo Rocha. As dificuldades esperadas e causadas por Ronaldinho Gaúcho não lhe mancharam a exibição que embora não tão brilhante como a da 1ª mão foi ainda assim bastante positiva. Infeliz no golo do melhor do Mundo em que falhou por completo o tempo de corte e o deixou sozinho para o 1-0. Já no fim do jogo li umas declarações suas que pretende sair do clube no final da época. Que vá, com o sentido do dever cumprido mas que alguém deixe cá a “nota” e não há-de ser pequena depois desta eliminatória.
Anderson e Geovanni foram duas das grandes desilusões da noite. O extremo brasileiro nunca conseguiu a velocidade e repentismo esperado e passou por completo ao lado do jogo. Não fez um lance digno de registo! Quanto ao central, a anormalidade dos lapsos defensivos. Tem responsabilidades nos dois golos ao falhar por completo duas intervenções que seriam essenciais. No 1º golo foi facilmente ultrapassado por Eto’o enquanto que no 2º golo falhou, com um pontapé na atmosfera, o corte do passe que isolou Giuly para a assistência de golo. Muito intranquilo!
E por fim, os desastres totais em Petit, Simão, Beto e nos suplentes Laurent Robert e Marcel.
O cérebro do meio campo, Petit, fez a sua pior exibição ao serviço do Benfica – pelo menos do que me lembro. Lentíssimo, distante e absolutamente desastrado nos passes. É o culpado directo do 2º golo com uma perda de bola inacreditável quando queria iniciar um contra-ataque. Para além disso fez um penalty patético com uma claríssima mão na bola. Mau demais para ser verdade! Foi, para mim, a maior desilusão até porque espero sempre muito do seu futebol e porque, de facto, o Petit dos últimos tempos tem estado quase sempre brilhante. Novo desastre em Beto, alguns cortes bem conseguidos mas os passes subsequentes saíram invariavelmente ou para os pés de jogadores do Barcelona ou para fora de campo. Culpado directamente no 1º golo com uma perda de bola surreal mesmo à entrada da área – lance a papel químico do golo de Scholes na Luz. Saiu muito, mas muito tarde!
Beto não é para estas andanças e parece, realmente, muito fatigado!
De Simão espera-se muito mas hoje tivemos muito pouco. Completamente fora do jogo apareceu no melhor lance do Benfica em todo o jogo – que falhou inacreditavelmente – e nos livres. Os livres foram mesmo uma das suas maiores nódoas. Quis marcar tudo, irritando até companheiros de equipa, e fez tudo mal. Lamentável!
Culpas no cartório também tem Koeman que inexplicavelmente o colocou numa posição para a qual não está, de todo, rotinado.
Dos suplentes que entraram, Robert e Marcel, zero lances positivos… pelo menos quando ainda interessavam para alguma coisa. Muito mal, patéticos mesmo – principalmente o francês!
Todos vimos a arbitragem ultra-caseira e habilidosa de Lubos Michel. Atitude perfeitamente espectável não só pelas equipas em confronto mas também pelo facto do jogo ser em Camp Nou. Se é verdade que poderá ter ficado um penalty por assinalar por mão na bola de Luisão – considerada falta à entrada da área mas de muito difícil juízo, só visível na repetição – o restante jogo foi uma vergonha descarada. Muitos dos ataques do Benfica foram simplesmente parados por faltas inexistentes ou foras de jogo patéticos – número que deve ser recorde na competição e ainda mais engraçado o facto de só os mais óbvios serem repetidos na TV.
O caseirismo do eslovaco é exemplificado aquando de um livre de Simão – com cruzamento directo à área – para a cabeça de Luisão – com um corte mais que claro de Oleguer para canto que deu… pontapé de baliza. Simplesmente enervante!
Puyol tem uma entrada verdadeiramente assassina aos pés de Beto – a pés juntos e sem toque na bola sequer – na qual o árbitro marca falta de… Beto. Inacreditável a quantidade de entradas duras deste jogador catalão!
Ronaldinho teve duas atitudes – não acredito que tenha sido de propósito – pouco dignas do que ele representa para o futebol. Em dois lances de protecção de bola – um sobre Ricardo Rocha, outro sobre Anderson – o jogador brasileiro levanta muito os braços e atinge com o cotovelo os jogadores do Benfica. Um amarelo por cada lance deveria ter sido mostrado, ou pelo menos um aviso para que não o fizesse.
Michel assinalou bem um penalty de Petit, em tudo idêntico ao que ficou por marcar na Luz. Toda a gente sabia – Koeman inclusive – que seria assim. Bastava haver a oportunidade e infelizmente houve!
Com a eliminação da única prova em que havia algumas hipóteses de conquista, o resto do ano desportivo do Benfica torna-se um pouco turvo. É pena que se fique com aquela sensação de que se poderia ter conseguido algo mais desta eliminatória, o que seria histórico. Perder quando o triunfo poderia ter acontecido é uma sensação horrível e que fica – pelo menos no meu caso – na mente por vários anos, principalmente quando o jogo é bastante importante. Faltou, claramente, a experiência dos grandes jogos!
A presença na Liga dos Campeões deste ano é fantástica, principalmente tendo em conta a comparação dos orçamentos das restantes equipas em prova e também observando que há 7 anos que o Benfica não participava. O balanço traduz-se em 4 vitórias (Lille 1-0, Manchester 2-1 e Liverpool 1-0 na Luz, Liverpool 2-0 em Anfield), 3 empates (Lille 0-0, Villarreal 1-1 fora de casa, Barcelona 0-0 na Luz) e 3 derrotas (Villareal 0-1 na Luz, Manchester 1-2 e Barcelona 0-2 fora de casa). Nada mau para um “campeão fantoche” que ia “envergonhar Portugal” com “goleadas em todos os jogos”. Para esses deixo o seguinte: Descansem que o vosso pesadelo cheio de amargura e raiva terminou finalmente, podem descansar mas por pouco tempo. Aguardem mais sofrimento para breve!
Observamos facilmente que o Benfica parece ter recuperado algum do prestígio que acumulou durante décadas e que ao longo dos últimos anos foi perdendo com classificações medíocres na Liga e com eliminações comprometedoras em eliminatórias preliminares de Competições Europeias menores.
Importante também realçar o fundamental encaixe financeiro do clube, resultante quer dos pontos obtidos e da qualificação para os 4ºs de Final mas também pelas fabulosas receitas de bilheteira dos jogos caseiros. Foram mais de 15 milhões de euros, verba que servirá em parte para fortalecer, ainda mais, o plantel para a próxima época.
Os benfiquistas devem sentir-se orgulhosos por tudo o que esta equipa nos tem dado nos tempos mais recentes. É bom voltar a sentir aquela Força do Benfica que há muito estava adormecida.
Para o ano voltamos a estar lá e é só isso que eu peço/exijo. Melhores momentos virão, certamente. Tenho a certeza que o Benfica vai voltar a ser Campeão Europeu. A águia vai voltar a subir ao topo, resta esperar o momento certo!
Apoiar Constantemente!
Acreditar Continuamente!
Orgulho Perpetuamente!
Contigo Sempre!
Sport Lisboa e Benfica, Eternamente!
NDR: Preparava-se para se iniciar o intervalo na transmissão da SportTV quando, e sem saber que ainda “estava no ar”, Miguel Prates – o relatador do jogo – em tom claramente jocoso e saltando uma valente gargalhada profere a seguinte afirmação: “Parece o Penafiel!”. Isto para além de nojento e demonstrativo de uma falta de nível e isenção é um insulto à equipa que fez uma extraordinária prova na Liga dos Campeões. Não pela comparação com o honrado clube do norte mas porque o objectivo foi o gozo e o desrespeito. Se de Miguel Prates tinha uma excelente opinião, para mim o seu valor acabou com esta atitude sorrateira e miserável.
Ficha do Jogo:
2ª mão dos 4º de Final da Liga dos Campeões
Camp Nou em Barcelona
Árbitro: Lubos Michel (Eslováquia)
FC BARCELONA - Victor Valdés; Belletti, Puyol, Oleguer e Giovanni Van Bronkhorst; Mark Van Bommel (Edmilson, 84 m), Andrés Iniesta e Deco; Henrik Larsson (Ludovic Giuly, 85 m), Samuel Eto'o e Ronaldinho Gaúcho.
Treinador: Frank Rijkaard.
SL BENFICA - Moretto; Ricardo Rocha, Luisão, Anderson e Léo; Manuel Fernandes (Marcel, 62 m), Beto (Laurent Robert, 72 m) e Petit; Geovanni (Karagounis, 55 m), Fabrizio Miccoli e Simão.
Treinador: Ronald Koeman.
Árbitro: Lubos Michel (Eslováquia)
FC BARCELONA - Victor Valdés; Belletti, Puyol, Oleguer e Giovanni Van Bronkhorst; Mark Van Bommel (Edmilson, 84 m), Andrés Iniesta e Deco; Henrik Larsson (Ludovic Giuly, 85 m), Samuel Eto'o e Ronaldinho Gaúcho.
Treinador: Frank Rijkaard.
SL BENFICA - Moretto; Ricardo Rocha, Luisão, Anderson e Léo; Manuel Fernandes (Marcel, 62 m), Beto (Laurent Robert, 72 m) e Petit; Geovanni (Karagounis, 55 m), Fabrizio Miccoli e Simão.
Treinador: Ronald Koeman.
Disciplina: Deco (8 m), Eto'o (59 m), Manuel Fernandes (62 m), Luisão (64 m), Anderson (83 m).
Golos: 1-0, Ronaldinho (19 m); 2-0, Samuel Eto'o (88 m).
O Barcelona vence a eliminatória por 2-0, fruto do empate 0-0 da 1ª mão em Lisboa.
#publicado em simultâneo com os Encarnados