O jogo da Luz com o golo de Luisão a resolver acalentava alguma esperança na qualificação. Todos sabemos que era muito difícil fazer aquilo que nunca nenhuma equipa do Benfica fez – eliminar o Liverpool da competição. Mas o Benfica é isto mesmo, é nunca baixar os braços, é acreditar até ao fim, é lutar até que as forças se acabem. Como disse o outro, nem que fossem 14!
Tal como para muitos o dia de jogo é algo indescritível. Mãos suadas, pouca concentração e muito poucas palavras sobre o jogo. Sai apenas um “Caramba, e se o Benfica ganhar?” de vez em quando. Que emoções tão grandes neste ano que é verdadeiramente fantástico!
Independentemente daquilo que acontecesse ficaria muito satisfeito com a prestação da equipa na Champions League já que passar a fase de grupos 7 anos depois da última participação é óptimo para uma equipa inexperiente e que vinha do pote 4.
No dia 7 – portanto, um dia antes do jogo – fiz 25 anos. Ao soprar as velas pedi dois desejos – palermice, eu sei, mas a minha irmã insiste com estas coisas – um por cada vela. Um não o posso dizer porque não se deve revelar antes que se concretize mas o outro era uma vitória do Benfica. Como diz LFV: É bom sonhar!
Anfiel Road, em Liverpool a abarrotar com 43 mil gargantas das quais 3 mil são portuguesas. Esperança no ar e em ambos os lados. Alguns fizeram milhares de quilómetros para desfrutar de uma fabulosa noite europeia num dos mais míticos estádios mundiais, e estão certamente com fé na equipa. O resto da nação benfiquista está de olho no que pode acontecer, os mais cépticos vaticinam uma gorda vitória para os da casa, os mais optimistas pedem a passagem do Benfica à próxima eliminatória. Apenas um colossal Benfica pode fazer frente ao actual Campeão Europeu em título.
Ouve-se a fabulosa música da competição, alguns jogadores – Luisão, Léo e Anderson – rezam para que tudo corra bem. O jogo começa com muitas dificuldades para o Benfica, com um sucessivo massacrar que dura aproximadamente 25 minutos. Algumas bolas no poste e incursões complicadas paradas por Moretto e pelos defesas. Mas o Benfica consegue segurar o ímpeto do adversário, apodera-se do meio-campo e tenta um rasgo de futebol ofensivo. De repente Nuno Gomes assiste Geovanni que estoira à barra. Remate fantástico, sem hipótese de defesa. Seria um golão! Na recarga Simão quase faz golo. Emoção demais para alguns, muitos gritos e lamentos. Porque é que aquela bola não entrou, pá? Dou comigo sem reacção, com as mãos na cara a tapar os olhos. Incrédulo! Num segundo, faço logo o filme do resto do jogo com o Benfica a perder e eu a lamentar-me por meses por aquele golo falhado.
Quando o Simão pega na bola e faz aquela obra-prima, as lágrimas correm-me pelo rosto. Golo! Benfica, Benfica, Benfica! É teu Simão, tu mereces! Andavas-te a poupar para isto, malandro! Por 2 ou 3 minutos não consigo ver mais nada do jogo. A emoção é muita. Quando acaba a 1ª parte, com mais alguns momentos complicados, estou plenamente confiante que o Benfica não vai ser eliminado, mas uma confiança tão grande que foi com relativa tranquilidade – um pouco abalada com aquele golo anulado a Fowler – que sigo a 2ª parte.
Entra Karagounis é tudo muda, o controlo do jogo é do Benfica apesar do domínio inglês. Um contra-ataque perfeito matará o jogo, Nuno Gomes tem a hipótese de terminar o sofrimento mas é lento, não chuta nem passa. Porra, Nuno! O que é isso?
Koeman aposta no velocíssimo Miccoli para os minutos finais. Agora é que vamos partir isto tudo, exclamo! Recupera mais uma vez Beto e o 30 italiano pega na bola a meio campo e mete em Simão. A classe do capitão vê Beto a desmarcar-se e endossa-lhe o esférico. Enorme Beto! Estoiro à baliza, bola para Miccoli e já está! O sonho é real, estamos de volta aos maiores momentos de glória.
O golo soberbo do Miccoli veio apenas confirmar o que há muito tempo todos sabíamos! O Benfica regressou às grandes exibições europeias e garantiu lugar nas 8 melhores equipas da Europa. Caiu o Campeão da Europa, ergue-se o Campeão Português. Só tu Benfica!
Ronald Koeman apostou numa equipa muito bem montada, suprimindo a lesão de Petit com a entrada de Beto, recolocando Simão no lugar de Karagounis e mantendo sem qualquer alteração o resto do 11 que entrou de inicio frente ao Estrela da Amadora.
O holandês esteve simplesmente perfeito neste jogo. Depois de todas as críticas que sofreu – minhas também – demonstrou vontade de vencer o jogo e isso foi fundamental para o bom resultado nesta eliminatória. Não só escolheu uma equipa mais ofensiva e com carácter de contra-ataque como optou bem pelas substituições efectuadas ao longo da partida – um pouco à semelhança da última jornada da Liga Portuguesa. Foi tudo bem feito, com uma pontinha de sorte, é verdade, mas com muito mérito.
Esta vitória é muito de Koeman mas também muito de Petit. Não tendo jogado hoje – o que me preocupou seriamente à priori – o 6 benfiquista tem sido fundamental nesta época e é muito por sua influência que a equipa chegou a esta fase. Não deve ser esquecido nestes momentos de grande alegria o que certamente não acontecerá tendo em conta o enorme carinho que tem dos adeptos.
A exibição foi globalmente muito boa e é difícil eleger um jogador que se sobressaiu aos demais. Ainda assim os que mais gostei foram Luisão e Simão.
O defesa-central brasileiro esteve a um nível “mozeriano”. Cortou tudo o que havia para cortar, equilibrou a equipa e manteve-se fundamental na propagação de confiança por todos os companheiros. Luisão é um jogador sublime e naqueles momentos de maior aperto foi o pilar do melhor Benfica europeu dos últimos 13/14 anos. A quantidade de intervenções positivas que teve no jogo foi abismal, por vezes várias na mesma jogada. O verdadeiro “capitão sem braçadeira” com apenas 24 anos mostrou-se, definitivamente, à Europa fuzilando por completo as críticas sem fundamento dos invejosos e aziagos.
A exibição foi tão impressionante e, aliada ao resto da campanha, ninguém se espantaria com a nomeação do jogador para um dos melhores defesas-centrais da Champions League deste ano. Faço votos para que seja, já que sou um profundo admirador do seu futebol!
Quanto a Simão, simplesmente a melhor exibição deste ano. Perfeito a defender – e muito – e com rasgos ofensivos geniais. Fez o 1º golo de uma forma só ao alcance dos melhores e está na jogada do 2º golo. Demonstrou aos ingleses o que é o Simão Sabrosa sendo que o valor do seu passe subiu, novamente, em flecha. Era imprescindível um Simão ao seu melhor nível e o capitão disse ao que veio: o melhor jogador do Benfica da actualidade.
Dou agora espaço às exibições que gostei menos, Nuno Gomes e Laurent Robert.
O francês foi uma desilusão ainda mais por tudo aquilo que se esperava dele no regresso aos palcos ingleses. Na minha opinião o injusto amarelo no 1º minuto condicionou-o de forma irreversível. Nem a espaços se viu, muito apagado e inconsequente. A inexistência de lances de bola parada também o prejudicou já que é essa a sua especialidade. Tem de fazer muito mais para garantir a titularidade na equipa. Deverá sair para entrar Miccoli, recolocando-se Geovanni na ala-direita.
Quanto a Nuno Gomes, a partida afigurava-se de muito trabalho mas foi para si ingrata. Bastante trapalhão mas ainda assim assistiu Simão para o 1º golo e Geovanni para o remate à barra. Não pode ser tão lento a este nível porque assim perderá o lugar na equipa mais cedo ou mais tarde. Alguns passes errados em zona proibida deram origem a lances perigosíssimos do adversário – um deu remate ao poste – e por incrível que pareça não fez um único remate à baliza. Manchou ainda mais a sua prestação com um amarelo escusado por não ter ouvido o apito do árbitro – num fora de jogo mal assinalado e que poderia ter dado golo – e fica de fora do próximo jogo europeu. Pede-se muito mais de um avançado do Benfica.
Todos os outros estiveram em altíssimo nível.
O guarda-redes Moretto fez, provavelmente, a melhor exibição desde que está no Benfica. Apesar de demonstrar os problemas do costume na saída aos cruzamentos – 2 falhanços comprometedores num remate ao poste e num golo anulado – esteve bastante atento e eficaz. De destaque uma defesa aos pés de Peter Crouch na 1ª parte e uma estirada fantástica num remate de longe de Xabi Alonso no 2º tempo. Com a altura que possui, tem a obrigação de melhor performance nos cruzamentos, só assim dará a segurança necessária ao sector defensivo. Ainda não me convenceu por completo mas, obviamente, tem todo o meu apoio. Deu uma chapada de luva branca àqueles que vaticinavam uma exibição desastrosa.
O companheiro ideal de Luisão, o também internacional brasileiro Anderson, esteve igualmente fantástico. De facto só uma exibição perfeita da dupla de centrais permitiria sair de Anfiel sem sofrer golos. Apresenta sempre aquele estilo de jogo “à justa” e quando parece que vai fazer falta faz um corte genial às pernas do adversário. Que dupla de centrais fortíssima!
No que diz respeito aos laterais Alcides e Léo é possível dizer que estiveram os dois melhores a nível defensivo que ofensivo. No caso de pequeno brasileiro lateral-esquerdo foi mais uma vez impressionante a capacidade defensiva no capítulo das bolas aéreas tendo em conta a sua altura. Alcides teve mais dificuldade em criar perigo devido à “ausência” de uma ajuda de Robert. Por outro lado, Léo no apoio a Simão esteve mais expedito e conseguiu mesmo algumas boas iniciativas mas sempre com atenções redobradas. Um dos melhores extremos-direitos do mundo, Luís Garcia, deve andar a ter pesadelos com o nº 5 benfiquista. A entreajuda dos dois aos centrais foi fundamental na obtenção deste resultado.
Uma das exibições de que gostei mais foi a de Manuel Fernandes. Foi um verdadeiro pêndulo no meio-campo pautando o jogo defensivo e o ofensivo. Há algum tempo que temos vindo a assistir a óptimas performances do jovem benfiquista mas a de Anfield foi a melhor de todas ainda para mais tendo em conta o adversário directo – Xabi Alonso.
Continua a pecar no remate mas o resultado perdoa todos os equívocos. Tanta juventude mas tanta maturidade faz dele um titular obrigatório. À atenção de Koeman.
E agora o “bico-de-obra”! O brasileiro Beto esteve absolutamente fabuloso, como nunca tinha visto. Nem contra o Manchester tinha estava tão bem. Simplesmente sublime na marcação ao genial Steven Gerrard teve ainda fulgor para assistir, aos 89 minutos, Miccoli no 2º golo da equipa. A quantidade de recuperações de bola fá-lo um dos homens do jogo. Quem diria? Mais uma chapada de luva branca. Imensa a minha felicidade ao ver que era sua a assistência que resolveu o jogo e a eliminatória.
Na posição que mais gosta, Geovanni, foi um dos obreiros da vitória. O seu momento mais alto foi o míssil enviado à barra naquele que seria mais um soberbo golo de sua autoria. Em forma é um dos melhores jogadores do Benfica e um dos meus preferidos. Foi fundamental a aposta de Koeman na sua titularidade já que a velocidade do brasileiro colocou em sentido a defesa da casa quando era preciso.
Para finalizar, a análise aos suplentes. A entrada de todos foi fundamental para um determinado propósito e num determinado momento – muitíssimo mérito para o treinador.
Karagounis entrou quando era necessário maior controlo emocional e também por acréscimo maior controlo da partida. O seu controlo de bola é fabuloso e revelou-se mais uma vez fundamental à equipa. É dos jogadores que mais admiro pela categoria mas também pela disponibilidade em ajudar a equipa mesmo que seja ao sair do banco, um exemplo de profissionalismo. Merece mais minutos mas a análise cuidada às suas exibições levanta a questão de uma maior qualidade exibicional quando lançado nas 2ªs partes.
“Ricardo foi a Rocha” necessária na marcação a Cissé. Secou por completo o francês quando a aposta no seu futebol foi bem visível. Confesso que tive medo na sua entrada pelo seu carácter intempestivo mas esteve muito bem nos 20 minutos que jogou. A sua entrada já é mais que previsível quando há que defender os resultados mas mesmo assim Koeman soube qual a hora certa de o lançar no jogo.
E por fim, Mi Mi Mi Miccoli. Genial jogador, 10 minutos de velocidade e pura classe. Uma “gancheta” sublime culminada com golo e uma dedicação ao pai que fez a viagem com a comitiva do Benfica. Por favor, opção de compra já! O jogador benfiquista que mais admiro, simplesmente fabuloso.
Já viram o pormenor das sobrancelhas?
Relativamente à arbitragem de Massimo de Santis posso dizer que mais uma vez me desiludiu e enervou. Extremamente caseiro como seria de esperar, prejudicou de forma assinalável o Benfica. A salvação na 1ª parte foi o árbitro auxiliar que cobria o ataque do Liverpool, que safou muitas das decisões erradas do seu superior. Logo no 1º minuto vi como seria a arbitragem do resto do jogo: um amarelo patético a Laurent Robert numa entrada dividida com Warnock e que condicionou por completo o resto do jogo ao francês. Depois disso algumas faltas inexistentes mas também alguns lances bem ajuizados e de difícil percepção. A simulação para penalty de Crouch foi bem admoestada ficando na ideia que se fossem uns certos “Costas” o resultado do lance teria sido bem diferente.
O pior do trabalho da equipa de arbitragem foi, de longe, a análise aos foras-de-jogo. Contei 3 mal assinalados com Geovanni e Nuno Gomes – por duas vezes – isolados em frente ao guarda-redes Reina. Cada vez se confirma de forma mais vincada o poderio da máfia “uefeira” prejudicando, claramente, as equipas portuguesas em competições internacionais. Facto que se mantém há anos e que também pôde ser visto no jogo do Chelsea de Mourinho.
Na crónica da 1ª mão escrevi “Espero, sinceramente, que se jogue para tentar ganhar ou pelo menos para fazer um golo” e “Será uma jornada fantástica com um ambiente demolidor mas se o Benfica marcar primeiro tem tudo para seguir em frente”. Felizmente tudo se confirmou pelo melhor.
Acrescenta-se mais uma página gloriosa e histórica no álbum de memórias de um dos mais fantásticos clubes de futebol do Mundo. Este é um jogo para ficar lado a lado com os míticos Leverkusen 4-4 Benfica, Benfica 2-1 Parma ou Arsenal 1-3 Benfica.
Obrigado Benfica, por estes momentos de alegria e emoção!
No que à próxima eliminatória diz respeito estou plenamente descansado. O mais difícil já foi feito e tudo o que vier a mais será por acréscimo. Às 11 horas de sexta-feira estarei atento ao sorteio e a torcer para que a equipa sorteada ao Benfica seja o Villarreal para a desforra ou mais uns ingleses, Arsenal. Se não for nenhum destes que seja o confronto com a melhor equipa do Mundo da actualidade, o Barcelona. Seria fantástico.
Paris é o sonho e tudo pode acontecer. Viva o Benfica!
NDR: Uma palavra também para o fabuloso público benfiquista que esteve presente em Anfield Road. Verdadeiramente arrepiante o “Ninguém pára o Benfica!”, o “SLB, Glorioso, SLB!” e o “Eh Eh Eh, SLB!” que se ouviu durante e no final do jogo. Na 2ª parte calaram por completo os 40 mil da casa que são considerados os mais ruidosos do mundo. É com adeptos destes que o clube continua a ganhar a dimensão que lhe pertence por direito. Soberbos!
Ficha do Jogo:
2ª mão dos 8ºs de Final da Liga dos Campeões
Estádio Anfield Road em Liverpool
Árbitro: Massimo de Santis (Itália)
LIVERPOOL FC - 'Pepe' Reina; Steve Finnan, Jamie Carragher, Stephen Warnock (Robbie Fowler, 70 m) e Djimi Traoré; Luis Garcia, Steven Gerrard, Xabi Alonso e Harry Kewell (Djibril Cissé, 62 m); Peter Crouch e Fernando Morientes ( Dietmar Hamann, 70 m).
SL BENFICA - Moretto; Alcides, Luisão, Anderson e Léo; Beto e Manuel Fernandes; Laurent Robert (Ricardo Rocha, 70 m), Nuno Gomes (Miccoli, 77 m) e Simão; Geovanni (Karagonis, 59 m).
Disciplina: Laurent Robert (1 m), Peter Crouch (31 m), Xabi Alonso (41 m), Nuno Gomes (62 m), Steven Gerrard (71 m), Manuel Fernandes (90 + 1 m).
Golos: 0-1, Simão (36 m), 0-2, Fabrizio Miccoli (89 m).
O Benfica apura-se para os 4ºs de Final com um saldo na eliminatória de 3-0 fruto da vitória por 1-0 no Estádio da Luz.
#publicado em simultâneo com os Encarnados